15 de agosto de 2009

A noite em que fui embora

“ Hoje eu sei por que a um tempo atrás eu não fui embora. Não fui por que não queria sentir a dor que estou sentindo agora. “

Noites frias de inverno conseguem ser as mais tristes e por isso as mais adequadas para chorar, andar por ruas vazias e sentir o verdadeiro sentido do que é solidão. São noites de ir embora.

Solidão existe sim. É quando algo se rompe, se perde, se esvai. Ficar só não é a solidão absoluta. Solidão é dor, é rompimento, é deixar de ter para sempre. É vazio que fica quando perdemos um pedaço de nós que nunca mais nos será devolvido. É perda total. Deve ser por isso que dói tanto.

Não é que não soubesse qual seria a sensação da dor. Sabia, mas não queria sentir. Agarrava a esperança e ela fugia. A esperança ficou cansada e se recolheu. Foi enfraquecendo e caiu prostrada, desistiu antes que se tornasse desmoralizada. Deu um basta, abandonando a luta a muito perdida. Rompimento, separação, dor e tudo sem esperança. Sufocante. Um pedaço inteiro do peito fora cortado, esmagado, sem piedade.

E era noite de inverno, sem ninguém naquelas ruas estranhas, sem gente e de casas fechadas. Só os faróis de poucos carros passando sem saber que tanta dor queria pegar carona pra bem longe dali. Medo, agonia e raiva, certo alívio aquietava a alma. Estava tudo chegando aos minutos finais. O jogo acabara sem vencedor. Todos haviam perdido um pouco de si, um pedaço irrecuperável de vida.

Nada poderia ser resgatado. Um amor condenado à morte pela insensatez, pelo preconceito, pela falta de coragem. Morto e andando sem rumo pelas ruas mortas daquela cidadezinha sem nenhum sentido. Morrendo só, sem ninguém que lhe segurasse a mão, sem tiro nem facada. Morrendo de inanição, de fraqueza, de fome ou porque não era de verdade, não era tão amor assim.

Mas como sabia doer, como sabia chorar. E se doía e chorava é porque era, porque foi e só estava indo embora desse jeito porque estava esgotado, cansado de querer ser sem poder ser. E se perguntando e se martirizando, com a certeza que seria um pouco eterno. Essa era a pior parte, ficar no eterno sem poder se libertar. Ficaria para sempre vagando naquelas ruelas frias ou se tornaria lembrança ou esquecimento? Qualquer coisa que não doesse tanto. Cicatrizes talvez, uma marca que ficasse para sempre, mas que não machucasse daquele jeito.

Antecipava a certeza de que sentiria para sempre o seu cheiro, que as marcas de suas mãos ficariam em mim enquanto eu vivesse. Cruel e insensato, mas por mais que não se deseje, o outro faz parte dessa engrenagem um tanto sórdida que nem mesmo a gente deseja se livrar. Vira saudade, esquecimento do que não se quer lembrar e nas noites frias sentimos a falta do calor dos corpos se misturando, se ajudando a aquecer.

É, vai virar saudade. Amor vira saudade sempre. Dorzinha perigosa de sentir. Perigosa demais. Dá vontade de voltar atrás, mesmo sabendo que nada será diferente do que foi, do que nos trouxe até aqui, a esta ruazinha deserta nesta noite fria, a esta dor sem volta, a esse tormento tirânico e insensato.
Eu não quis seguir com ele, mas sei que vai me fazer falta, que não vou nunca mais viver um amor como esse, que esgotei minha capacidade de me fundir com quem quer que seja.

Vou ter que aprender a ocupar esse espaço tão grande e tão vazio que ficou no meu peito, queimando e ardendo feito brasa.
E cheguei ao fim do caminho. Já vejo algumas janelas e portas abertas. Estou voltando para onde comecei. Logo estarei em casa . Amanhã será outro dia, quem sabe haverá sol e caminharei pelas ruas conhecidas da minha cidade, sem medo e sem sentir a dor que estou sentindo agora.

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